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AI & Photoshop

A Ética da Manipulação Digital e o Uso do Photoshop

por
Felipe Guimaraes e Equipe Aela
12/5/2022
4
minutos de leitura
Índice de conteúdos

A manipulação digital é bem comum em diversos tipos de trabalho, desde o jornalismo, passando pelas artes, até a publicidade.

Mas até qual ponto que a manipulação digital é aceitável? Diante de diversos impactos que alterações em imagens podem causar, aonde é que a ética se encontra?

Neste artigo, falamos um pouco sobre qual o impacto da manipulação digital em alguns mercados e como que é possível tratar esse assunto com mais ética.

A manipulação de imagens está muito fácil

A criação do Photoshop foi uma verdadeira revolução no mercado fotográfico e de design gráfico. A facilidade com que o programa edita imagens é o motivo de toda a sua popularidade até hoje.

Nesse sentido, o Photoshop abriu portas para novas oportunidades criativas para as artes visuais, permitindo que artistas trabalhem as suas ideias com mais "facilidade".

No entanto, apesar desse lado ferramental útil do Photoshop, o que não foi possível prever era um lado mais obscuro, em que a manipulação de imagens pudesse causar muitos impactos negativos no mercado e na sociedade.

A partir disso, as discussões são muitas em torno da ética na utilização de programas de edição de imagens, como o Photoshop e outros.

Dica de Leitura: Imagem Digital - Os Diferentes Tipos e Formatos

Os impactos da manipulação digital

Quando falamos sobre problemas com a manipulação digital, não nos referimos às ilustrações ou artes conceituais que também utilizam o Photoshop. O que cria um debate de questão ética são as edições de imagens para publicidade e jornalismo, na maioria das vezes.

Publicidade

Na publicidade, o maior problema acontece nos mercados de moda, beleza e estética.

Os retoques em imagens sempre existiram, mesmo antes da criação do Photoshop e outros programas de edição. A diferença é que o processo era mais trabalhoso e envolvia mais recursos e técnicas diferentes.

No entanto, ao mesmo tempo em que a criação de softwares facilitou o processo de retoques em imagens, também possibilitou fazer diversas outras modificações corporais profundas, como alongamento de pernas e afinamento da cintura e nariz.

Nesse sentido, a manipulação que antes era utilizada para esconder uma mancha ou uma espinha indesejada, acabou se tornando um recurso para moldar pessoas dentro de um padrão de beleza.

Modelos começaram a ter seus corpos e rostos manipulados tão intensamente que o resultado final expressava uma "beleza" completamente fora da realidade. Em alguns casos chegando a beirar o absurdo, como no caso da marca Ralph Loren com a modelo Filippa Hamilton.

Manipulação de foto no photoshop

Moldar corpos visando uma estética irreal tem um impacto negativo muito grande na sociedade, principalmente com o público feminino.

Mulheres já sofrem com diversas pressões estéticas impostas pela sociedade e ao se compararem com capas de modelo totalmente manipuladas, podem acabar adquirindo transtornos mentais e prejudicando a própria saúde em busca do "corpo perfeito".

Dessa forma, imagens manipuladas no mercado da moda e beleza podem contribuir para o desenvolvimento de bulimia, anorexia, depressão e até mesmo transtorno dismórfico corporal, em que a pessoa tem uma percepção falsa da própria imagem corporal.

Muitas empresas e movimentos surgiram e se mostraram contra a prática de manipulação exagerada para disseminar um modelo de beleza e estética fora da realidade. Uma campanha muito famosa foi a da Dove, Retratos da Real Beleza de Dove:

Jornalismo

Quando pensamos em jornalismo, uma das primeiras coisas que nos vêm à cabeça é o conceito de neutralidade e verdade.

No entanto, sabemos que existem opiniões, polêmicas e pontos de vista que acabam sendo refletidos nos meios de comunicação e isso inclui os veículos de notícia e informação.

O problema começa a acontecer quando notícias e fotos manipuladas começam a ser feitos com o intuito de manipular a opinião pública.

Se ética e photoshop na publicidade diz respeito a discussões sobre estética e beleza, no jornalismo o debate é sobre parcialidade e mentiras propositais. Embora, nem mesmo políticos estejam livres de terem suas imagens manipuladas para melhorar sua estética, assim como aconteceu com o ex-presidente francês Nicolas Sarkozy:

Manipulação de foto de político
Fonte: G1

Portanto, assim como na publicidade, a manipulação de imagens no fotojornalismo pode ter impactos profundos na sociedade e, até mesmo, internacionalmente. Em 2010, o jornal egípcio Al Ahram manipulou uma foto do encontro do presidente egípcio Hosni Mubarak com o então presidente dos Estados Unidos Barack Obama.

Foto manipulada
A foto foi manipulada para colocar o presidente do Egito à frente do presidente dos EUA

Fake News

Apesar de não ser jornalismo, é importante ressaltarmos o uso de manipulação de imagens para a disseminação de Fake News.

As Fake News têm o objetivo de manipular o público, distorcendo fatos e fotos para que pareçam verdade e, dessa forma, destroem reputações e criam força baseadas na mentira.

Não é exagero dizer que o combate às Fake News é extremamente importante e isso inclui medidas para que os próprios softwares consigam identificar que imagens foram manipuladas ou não.

A Adobe tem pensado em formas de como combater e evitar esse tipo de manipulação de imagens para fins de Fake News.

Dica de Leitura: Redes Sociais - Precisamos Falar Sobre Nossa Saúde Mental

Artigos Científicos

Outra situação, essa talvez menos conhecida, em que a manipulação de imagens está sendo usada indevidamente é no mundo acadêmico dos artigos científicos.

A consultora e microbiologista Elizabeth Bik efetuou uma pesquisa em mais de 20 artigos da área científica de biomedicina e descobriu que 4% dos papers possuíam algum tipo de imagem adulterada ou duplicada.

A manipulação de imagens em experimentos científicos contemplam desde alterações das características das fotos, como reposicionar alguns elementos, até recortes seletivos e inclusão por ferramentas de edição de dados ou evidências inexistentes.

Por conta disso, um grupo de empresas de comunicação científica montou e divulgou um documento que trata das boas práticas na manipulação digital em artigos acadêmicos. O documento pode ser encontrado no site da Open Science Framework.

Qual é o limite da manipulação digital?

Com todas as questões problemáticas envolvendo a manipulação de imagens e o uso de ferramentas como o Photoshop, a pergunta que fica é se devemos parar de utilizá-las ou então, qual é o limite do seu uso.

Como regra geral podemos dizer que o limite para a manipulação de imagens é a verdade e a intenção. O quanto que estamos distorcendo o que é real, com o intuito de enganar ou manipular certo grupo de pessoas? Essa questão é relevante principalmente quando falamos sobre jornalismo e artigos científicos, os quais possuem o papel principal de informar e compartilhar conhecimento.

Por outro lado, a fotografia em si é considerada uma arte visual, e por isso é mais nebuloso aplicar o conceito de "verdade". Há ainda quem diga que nenhuma foto é uma representação real daquilo que foi captado, porque há intenções artísticas por trás, com significados menos literais.

Nesse sentido, a manipulação na fotografia pode ter um limite que diz respeito à qualidade da imagem. Nesses casos, softwares de edição são utilizados para melhorar a qualidade da imagem, entregando o sentido e a intenção pensada por quem está fotografando.

No entanto, quando falamos em publicidade, a discussão se torna um pouco mais polêmica porque a fotografia faz parte de uma intenção de vendas e promoção de um produto ou marca, e não é algo meramente artístico.

Sendo assim, é possível encontrar campanhas publicitárias que manipulam imagens para estabelecer padrões inalcançáveis — como já visto nesse artigo — ou para tentar convencer dos benefícios de algum produto. Por exemplo: a manipulação de imagens na pele do rosto de uma modelo, em uma propaganda de creme anti-rugas. Nesse caso, é claro que a manipulação teve um efeito de persuadir/ enganar consumidores.

Portanto, as pessoas que trabalham com manipulação digital têm que ter compromisso com a verdade e não construir imagens com más ou segundas intenções. Nesse sentido, a ética nesse tipo de trabalho é muito importante.

Por que falar em ética?

Ética é uma daquelas palavras que todo mundo conhece, mas ninguém consegue explicar direito o que é.

Existem muitos tipos de visão sobre ética, de diversos filósofos e pensadores. Uma que faz bastante sentido para a discussão sobre manipulação digital está sob o olhar do utilitarismo.

Nessa visão, a ética consiste em práticas cujo objetivo deve ser beneficiar a maioria das pessoas, colocando à frente seus interesses e os da comunidade.

Nesse sentido, ter ética significa entender quais são as consequências e resultados das suas próprias ações. No caso, qual é o impacto de uma manipulação digital nas pessoas  que consomem determinado produto?

As ações devem prezar pelo bem-estar da maioria, e não apenas de uma empresa, ou algum grupo de empresários que se beneficiaram das vendas de um produto por meio de uma campanha com imagens manipuladas intencionalmente.

Um dos grandes problemas é que não existe um código de ética especificamente para quem utiliza manipulação digital ou programas como Photoshop. Praticamente qualquer pessoa pode aprender a utilizar e a editar imagens com softwares específicos. Assim, nesses casos, a ética fica sempre a critério de quem está manipulando e não sob um conjunto aprovado de normas e boas práticas.

Ainda que exista um tipo de código de ética para profissionais da propaganda, não há nele qualquer norma específica para o trato de manipulação digital de imagens, deixando a interpretação bastante aberta para quem ler.

Dica de Leitura: The Great Resignation - Por Que Profissionais Estão Se Demitindo?

Regulamentação da manipulação digital

Tendo em vista os impactos que o mau uso da manipulação digital oferece, há um Projeto de Lei em trâmite no Brasil, que obriga a identificação de retoques digitais de modelos em campanhas publicitárias.

A ideia é que as campanhas tenham mais transparência e avisem as pessoas consumidoras sobre possíveis manipulações digitais nas fotos publicitárias.

Outros países já adotaram medidas parecidas como essa, como a França e a Noruega. Em ambos países as campanhas são obrigadas a colocar um aviso nas fotos que sofreram alterações ou qualquer tipo de manipulação.

Apesar de ser uma medida interessante e que visa a proteção das pessoas consumidoras, um questionamento quanto à isso é válido: quanto que obrigar as empresas a colocarem um aviso do tipo "imagem meramente ilustrativa" vai realmente impedir manipulações digitais enganosas e que, de alguma forma, tenham impacto na vida das pessoas?

Nós somos bombardeados por fotos meramente ilustrativas o tempo todo — as fotos dos cardápios de hambuguerias fast food que o digam. O quanto que isso também não é brincar com nosso imaginário e mudar nossa percepção de realidade, mesmo que inconscientemente?

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